No mesmo período em que ocorreu o 4º Encontro Hemisférico de Luta contra a Alca, de 27 a 30 de abril em Havana, os governos de Cuba e Venezuela firmaram 49 acordos de cooperação que dão início à implementação da Alternativa Bolivariana para as Américas (Alba). "Alba significa ’sol nascente’, significa um novo amanhecer nas Américas, onde os povos se levantam, dispostos a ser livres ou morrer", anunciou o presidente Hugo Chávez.

Os acordos da Alba incluem uma ampla gama de compromissos sociais e econômicos, baseados na solidariedade e no respeito à soberania dos povos. O primeiro ponto do documento diz respeito à saúde, com a formação de 30 mil médicos venezuelanos em Cuba. O governo cubano também se comprometeu a realizar 20 mil cirurgias em venezuelanos de baixa renda, que não têm acesso, por exemplo, a transplantes em seu país. Um dos programas em curso é a chamada "Operação Milagre", pela qual milhares de venezuelanos cegos por problemas de catarata têm recebido atendimento em Cuba.

"Durante um evento na periferia de Caracas, um menino de três anos, com o corpo todo queimado, burlou a segurança e veio correndo em minha direção dizendo: ’Chávez, me salve! Me mande para Cuba!", conta o presidente, que visitou o menino em um hospital de Havana.

Analfabetismo zero

Outro objetivo fundamental da Alba é transformar a Venezuela em "território livre de analfabetismo", a exemplo de Cuba. Para isso, o governo cubano vai aumentar seu apoio à educação popular. Nos últimos dois anos, educadores cubanos alfabetizaram 1 milhão e 400 mil pessoas na Venezuela.

O governo venezuelano anunciou também a instalação de uma sede da PDVSA (empresa petroleira da Venezuela) e do Banco Industrial da Venezuela em Havana. Em contrapartida, será criado um Banco de Cuba na Venezuela. Os dois países anunciaram ainda a criação da TV Sul, uma rede continental de televisão. Os 49 memorandos e acordos de cooperação incluem também iniciativas nas áreas de transporte, desenvolvimento tecnológico, turismo, meio ambiente, produção agrícola, entre outros.

A implementação da Alba coincide com uma situação de impasse nas negociações da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), prevista para ter início em janeiro de 2005. Este prazo não foi cumprido e, atualmente, não existe nem mesmo acordo sobre um calendário de negociação. Isso representa uma importante vitória para os movimentos sociais que compõem a Campanha Continental Contra a Alca e reivindicam que seus governos abandonem esse projeto de submissão aos interesses do governo e das empresas estadunidenses.

O impasse nas negociações da Alca levou os Estados Unidos a tentarem firmar acordos comerciais subregionais, como no caso dos Tratados de Livre Comércio (TLCs) Andino, da América Central e do Caribe. Mesmo recebendo grande pressão, muitos países dessas regiões se opõem às condições dos EUA ou têm problemas para justificar sua negociação, frente à forte oposição popular.

Diante da dificuldade para estabelecer uma nova reunião ministerial da Alca, os Estados Unidos propuseram realizar uma Cúpula Presidencial sobre "governabilidade democrática, combate à pobreza e geração de emprego", em novembro na Argentina. O anúncio de uma "agenda positiva" visa encobrir as reais prioridades dos EUA para a região: desestabilizar os governos de Cuba e Venezuela, avançar em acordos bilaterais que possam substituir a Alca (incluindo mecanismos de desvio de recursos do setor público para o privado, como as Parcerias Público-Privada), submissão dos exércitos latino-americanos e sua participação no Plano Colômbia, e controle de recursos estratégicos na região do Plano Puebla-Panamá, na Amazônia e na Tríplice Fronteira.

Em oposição a esse evento, a Campanha Continental contra a Alca vai realizar uma Cúpula dos Povos em Mar Del Plata. A Campanha decidiu também priorizar a luta contra a Organização Mundial do Comércio (OMC), que fará sua próxima reunião ministerial em dezembro.

O Brasil tem um papel central na OMC e sua participação pode destravar as negociações sobre agricultura, bens industriais e serviços. Até a reunião do Conselho Geral da OMC, em julho, serão negociados acordos sobre setores estratégicos, como sistemas financeiros, energia, comunicações, saúde, transporte e educação. A posição do governo brasileiro na OMC pode determinar a capacidade de nosso país desenvolver políticas agrícolas e industriais, e de garantir direitos básicos para a sociedade.

Brasil de Fato