Na madrugada do dia 16, Caracas foi despertada pelo estrondo e pelas luzes de fogos de artifício, disparados dos milhares de casebres empilhados nas montanhas que cercam a capital venezuelana. Eram os barrios - as favelas de lá - festejando o resultado do referendo que dera ao presidente Hugo Chávez quase 5 milhões de votos, cerca de 60% do total apurado, assegurando sua permanência no poder até 2006, conforme manda a Constituição do país.

Com esse resultado, a revolução bolivariana comandada por Chávez entra em uma nova fase. A derrota acachapante que o chavismo impôs às oligarquias não significa que a guerra acabou - ao contrário, pode estar começando agora. Os nocauteados não são meia dúzia de gatos pingados, mas representantes das trinta famílias que há décadas dominam a Venezuela. Encarapitados na PDVSA, a estatal petrolífera que sempre foi um estado dentro do estado, eles fizeram evaporar, entre 1960 e 2000, uma fortuna equivalente a doze Planos Marshall, recursos decorrentes das receitas da exportação de petróleo. Esses números passam a fazer sentido quando se sabe que a Venezuela é o terceiro maior exportador de petróleo do mundo (só perdendo para a Arábia Saudita e para os Emirados Árabes) e dona de reservas estimadas em 80 bilhões de barris, superiores às da Nigéria, da Líbia, da Argélia, do Qatar e da Indonésia. Visto está que não se trata de uma república bananeira.

O que aconteceu na Venezuela dia 15 não diz respeito apenas aos 26 milhões de venezuelanos, mas a todos os que lutam contra a maré neoliberal que a globalização tenta impor ao mundo. Renasce em Caracas a frustrada esperança de que os governos de Lúcio Gutierrez, no Equador, e de Lula, no Brasil, pudessem ser trincheiras dessa guerra desigual. Hugo Chávez passa a dispor do indispensável respaldo popular para levar adiante a revolução bolivariana, mas a vigilância e a solidariedade internacional têm que ser permanentes.

Fernando Morais é escritor brasileiro