Dia 14, George Bush recoloca em pauta na ONU sua proposta contra o governo de Cuba. Desta vez, o Brasil não pode se abster do debate e engolir uma moção que não tem nada a ver com direitos humanos, mas tudo a ver com política.

Desde que declarou seu direito de “ataques preventivos” contra quem considere que atenta contra seus interesses e o colocou em prática com a invasão do Iraque sem aprovação da ONU, o governo norte-americano se colocou à margem de toda e qualquer legalidade internacional. As ameaças que segue fazendo contra Irã, Coréia do Norte e Cuba, além da ocupação do Iraque, confirmam como o governo Bush deseja substituir a legalidade internacional pelos seus interesses, valendo-se para isso da força.

Qualquer iniciativa desse governo no plano internacional está assim inevitavelmente contaminado por sua doutrina belicista. Tudo é feito para tentar impor e consolidar os interesses imperiais nos quatro cantos do mundo.

Faz parte dessa guerra contra a paz, a resolução pacífica e justa dos conflitos e a soberania dos povos, uma iniciativa anual do governo norte-americano de tentar fazer aprovar na ONU uma resolução de condenação de Cuba por suposta violação maciça e sistemática dos direitos humanos. Um paradoxo que o governo que mais viola os direitos humanos pelo mundo afora - a começar pelo território cubano, onde a base naval de Guantânamo é ocupada ilegalmente há mas de um século - se atreva a patrocinar condenação do governo cubano.

Todos sabem que não se trata de uma discussão sobre os direitos humanos - senão por que países como o Iraque, o Afeganistão, os territórios palestinos ocupados por Israel e a própria base naval de Guantânamo não são o centro de preocupação da Comissão de Direitos Humanos de Genebra? Simplesmente porque se trata de uma resolução política, com que o governo norte-americano busca apoiar a luta das forças terroristas do exílio cubano, que estão sediadas na Flórida, contra o governo de Cuba. Ninguém que se preze pode acreditar que se trate de um debate sobre direitos humanos, sabendo que se trata de uma iniciativa política, que faz parte da “guerra infinita” do governo Bush.

No ano passado, depois de muitas dificuldades - que incluíram a desistência do governo do Peru de ser agente de Washington para apresentar a proposta (o Parlamento desse país proibiu o governo de Alejandro Toledo de se prestar a esse papel) - foi o finado governo de Jorge Battle, do Uruguai, quem apresentou a proposta. Mesmo com todas as pressões do governo dos EUA, a moção só foi aprovada por um voto. O governo “socialista” de Ricardo Lagos no Chile, desobedecendo resolução do seu partido, votou com o governo Bush - com o qual havia acabado de assinar um vergonhoso acordo bilateral -e foi o voto decisivo.

O Brasil e a Argentina se abstiveram de votar. Com essa atitude, terminaram colaborando para que operação do governo Bush triunfasse. No dia 14 de março, volta-se a discutir nova iniciativa do governo dos EUA - que ainda busca quem se disponha a apresentar sua proposta - em Genebra.

Desta vez o Brasil não pode manter a mesma posição, inclusive porque nosso país votou contra uma resolução similar de condenação da China. O mesmo argumento deve valer para esta resolução - a de que se trata de uma operação política do governo Bush contra Cuba, que não tem nada a ver com direitos humanos, mas com o bloqueio econômico, com as agressões terroristas que partem de território norte-americano contra os cubanos e com todos os tipos de agressão que esse governo perpetra sistematicamente contra o governo do país.

A decisão brasileira, assim com a argentina, deve pesar decisivamente no destino de mais essa grosseira iniciativa do governo Bush. Quem luta pela resolução pacífica dos conflitos mundiais, pelo restabelecimento das normas do direitos internacional na relação entre os Estados do mundo e a solidariedade como princípio básico entre os povos e os governos não pode ficar alheio, menos ainda colaborar para que essa demonstração da prepotência estadunidense se imponha.