No que muitos especialistas consideraram como um reforço no multilateralismo e, conseqüentemente, uma contraposição à hegemonia da política externa estadunidense, os presidentes do Brasil, Venezuela, Colômbia e o primeiro-ministro da Espanha estiveram, no dia 29 de março, em um encontro de cúpula na Ciudad Guayana, na Venezuela.

No encontro, Luiz Inácio Lula da Silva, Hugo Chávez, Álvaro Uribe e José Luis Zapatero discutiram acordos e intenções de cooperação em diversas áreas, entre elas, energia, defesa, integração econômica e comercial e combate ao narcotráfico e ao terrorismo, temas caros aos Estados Unidos de George W. Bush. Além disso, no documento fi nal da cúpula, rechaçaram a ingerência externa em assuntos de qualquer país, como forma de garantir a paz e estabilidade internacional na América do Sul e propuseram esforços conjuntos de combate à pobreza.

Em claro recado aos Estados Unidos, o documento ressalta também a importância do multilateralismo nas relações internacionais, com o enfrentamento de controvérsias entre países por meio das vias diplomáticas.

Falando à Agência Brasil, o vice-ministro venezuelano das Relações Exteriores para América Latina e Caribe, Eustoquio Contreras, ressaltou a importância da cúpula que, apresentou “novos paradigmas nas políticas externas” dos quatro países e costurou uma nova geopolítica na América do Sul. “Estamos substituindo, no plano multilateral, a idéia de competência, que pressupunha uma hierarquização entre ricos e pobres, pelo conceito de complementaridade”, explicou.

Nessa linha, os mandatários dos quatro países sinalizaram a boa vontade em relação a acordos de cooperação, indo além do caráter fundamentalmente político do encontro. Entre eles, a atuação conjunta dos três países sul-americanos - com contribuição do governo espanhol - nas fronteiras amazônicas nas áreas de preservação ambiental e defesa, a criação de infra-estrutura física de transportes, energia e comunicação e a cooperação policial e judicial no combate ao terrorismo e ao narcotráfico.

Apoio à Venezuela

Em seu discurso, o presidente Lula criticou a ingerência estadunidense no continente sul-americano e saiu em defesa do colega venezuelano. “Tem gente falando mal de nós pelo mundo. Quero dizer ao presidente (Hugo) Chávez que não tenho nenhuma dúvida em afirmar em qualquer lugar do mundo que não aceitamos difamações contra nossos companheiros. Não aceitamos insinuações contra nossos companheiros”, afirmou Lula, que completou: “Nós, da América do Sul, somos capazes de cuidar de nossos assuntos”.

Durante visita ao Brasil, o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Donald Rumsfeld, havia manifestado “preocupação” com a compra pela Venezuela de 100 mil fuzis da Rússia. O presidente da Venezuela, em sua fala, também rebateu as acusações estadunidenses.

Combate ao narcotráfico

Os Chefes de Estado do Brasil, Venezuela e Espanha reafirmaram apoio político à resolução dos problemas de segurança interna da Colômbia, que há 40 anos passa por enfrentamentos entre governo, guerrilhas e grupos paramilitares. Lula afirmou que o presidente colombiano, Álvaro Uribe, “pode ter certeza de que terá no Brasil um sócio para ajudar nisso”. Chávez disse que seu país não tolera a presença de grupos terroristas. “No mesmo minuto que pise em solo venezuelano, serão tratados como inimigos”, garantiu.

Principais pontos discutidos na cúpula:

 Integração econômica, social e cultural dos países da América do Sul, com destaque para o fortalecimento da Comunidade Sul- Americana de Nações, do Mercosul e da Comunidade Andina de Nações (CAN);
 Integração no âmbito da Comunidade Ibero-Americana, da qual fazem parte os quatro países;
 Cooperação internacional na luta contra a fome e a pobreza;
 Reforma da Organização das Nações Unidas (ONU);
 Combate ao narcotráfico e ao terrorismo: cooperação na área policial e judicial;
 Cooperação na área das fronteiras amazônicas entre os três países sul-americanos nas áreas de preservação ambiental e defesa do território;
 Acordos na área de energia, seguindo o exemplo dos entendimentos entre Petróleos Venezuela (PDVSA) e Petrobras para a construção conjunta de uma refinaria no Brasil e a criação da Petroamérica;
 Criação de infra-estrutura física de transportes, energia e comunicação: por exemplo, proposta de construção de gasoduto ligando Venezuela e Colômbia.