Para aqueles que, como eu, estudaram teologia nos anos de 1970, o nome de Joseph Ratzinger era uma constante presença nos textos e livros com os quais aprendíamos os diferentes tratados ou disciplinas teológicas. Seu belíssimo livro “Introdução ao Cristianismo”, um profundo comentário teológico sobre o Credo, marcou meu estudo do tratado de Deus Uno e Trino. Assim também seu outro livro, “O novo povo de Deus”, foi meu manual de curso ao estudar o tratado de Eclesiologia.

Não se restringem apenas a estes títulos, evidentemente, as obras do teólogo Joseph Ratzinger. São inúmeros livros, artigos, textos que refletem uma teologia sólida, que recolhe o melhor do Concílio Vaticano II, com uma beleza e clareza de estilo raramente encontradas entre os de sua geração na teologia européia.

Depois acompanhei seu desempenho à frente da Sagrada Congregação para a Doutrina da fé. Assisti aos seus embates com teólogos da América Latina, Ásia e alhures, na preocupação da defesa da pureza da doutrina. Li também os documentos que produziu como prefeito da Congregação. Destacaria “Sobre alguns pontos da meditação cristã”, de 1989, sobre a oração, e a tão discutida “Dominus Iesus”, do
ano 2000. Apesar dos sentimentos que provocaram estes documentos e outros emanados de seu pensamento, ali estava, em plena atividade, o teólogo, ou seja, aquele que recolhe o dado revelado e procura pensá-lo em total fidelidade à revelação e à tradição da Igreja.

Não foi portanto sem surpresa que ouvi seu nome anunciado pelo cardeal Medina como o novo Papa. Sempre pensei no atual Papa como um intelectual que punha ao serviço da Igreja sua inteligência e a formação recebida para construir uma reflexão teológica. Um pesquisador, um pensador, essa era a imagem que eu tinha do Cardeal Ratzinger.

Agora, enquanto o ouvia dirigir suas primeiras palavras aos fiéis ali reunidos, procurava vê-lo sob novo prisma, revestido de sua nova identidade: a de Papa Bento XVI, Pastor Supremo da Igreja Católica, responsável pelos muitos milhões de católicos do mundo inteiro. Via os olhares da humanidade, de oriente a ocidente, voltados sobre ele, e enquanto me acostumava a observar revestido das vestes brancas papais o não mais Cardeal Joseph Ratzinger, mas sim Papa Bento XVI, chefe da minha Igreja, sondava meu coração e as expectativas que tenho sobre seu pontificado.

Evidentemente, um papa teólogo é uma garantia de ter à frente da Igreja alguém inteligente, pensante e ciente dos desafios e pontos críticos com os quais a teologia deve dialogar hoje. Linguagem posterior à da revelação e da fé, a teologia é palavra humana aderente e aderida à Palavra de Deus, devendo expressar nas diferentes culturas e situações o que Deus está dizendo hoje aos homens e mulheres de hoje.

Neste sentido, o desafio de Bento XVI, o papa teólogo, é imenso. Como pontífice, recebe um mundo marcado pela pluralidade e pelas aceleradas mutações. Certamente não deixará de pensar sobre elas como teólogo, mas é agora chamado a fazê-lo sobretudo como pastor.

E como pastor seu foco sobre as questões doutrinárias será necessariamente diferente, uma vez que não estará mais dialogando apenas com seus pares, mas com todo tipo de pessoas; sua atitude deverá ser outra, uma vez que, além de pensar, agora é sobretudo chamado a velar com paternal solicitude sobre todo o rebanho do Senhor que lhe foi confiado pelo colégio dos cardeais.

Por isso, diante do papa teólogo, passada a primeira perplexidade, creio que a atitude correta é a esperança. Esperemos que de seu pontificado brotem frutos de tempos mais risonhos para o exercício da teologia, tão importante hoje para alimentar a fé e a esperança do povo de Deus.