“Os Estados Unidos têm a responsabilidade inequívoca e imperdoável de considerar que as políticas que aplicaram na América não só provocaram miséria, pobreza e uma grande tragédia social, como também instabilidade institucional e a queda de governos democraticamente eleitos”, assegurou o presidente da Argentina, Néstor Kirchner, na abertura da 4ª Cúpula das Américas, no dia 4. Diante de George W. Bush, o argentino acrescentou que a democracia não é um patrimônio de nenhum país ou região.

“Nossos pobres, nossos excluídos, nossos países, nossas democracias já não suportam mais que sigamos falando em voz baixa. É fundamental falar com muito respeito e em voz alta para construir um sistema que coloque todos em um marco de igualdade”, discursou o presidente anfitrião do encontro realizado em Mar del Plata.

Perversidade

Não foi a primeira vez que o presidente estadunidense ouviu palavras ásperas de seu homólogo argentino. Isso ocorreu também em janeiro de 2004 em Monterrey, no México. Dessa vez, Kirchner recordou que Bush, em sua posição de primeira potência mundial, deve fazer um exercício responsável dessa liderança e apoiar as estratégias de crescimento sustentável dos países menos desenvolvidos, “na convicção de que ali está sua conveniência, ajudando o mundo a ser mais estável, seguro e pacífico”.

O presidente argentino criticou também o Fundo Monetário Internacional (FMI) por realizar o “exercício perverso” de conceder os empréstimos que provocaram a crise financeira da Argentina e por, ainda hoje, continuar impondo as mesmas políticas que levaram o país à suspensão do pagamento da dívida externa.

Kirchner também fez poucas concessões em relação à Área de Livre Comércio das Américas (Alca). “Não nos servirá qualquer integração, simplesmente formar um convênio não será um caminho fácil rumo à prosperidade”, disse acrescentando que só será possível aquela integração que reconheça as diversidades e permita benefícios mútuos. “Um acordo não pode ser um caminho de uma só via de prosperidade, não pode resultar de uma imposição com base em relativas posições de forças”, criticou. O presidente argentino também fez referências ao acordo de livre-comércio proposto pela União Européia, dizendo que é necessário criar salvaguardas e compensações para quem padece de atrasos relativos.

Satisfação

Ao final do encontro, Néstor Kircher considerou que o resultado da 4ª Cúpula das Américas foi um “fato histórico para o Mercosul e para a Venezuela”, que resistiram à dura intenção dos Estados Unidos de ressuscitar o projeto da Alca. Para ele, a Declaração final representa o triunfo da posição latino-americana de mudar o eixo das discussões sobre integração para os verdadeiros temas regionais e as justas demandas dos povos.

A posição de Washington encontrou ferrenha resistência na Argentina. O presidente estadunidense teria ficado “surpreso” com o considerável crescimento do sentimento antiimperialista na população argentina, expresso na marcha que juntou dezenas de milhares de pessoas em Mar del Plata e respaldado pelo discurso de Kirchner.

La Jornada