O principal encontro internacional da sociedade civil veta, em sua Carta de Princípios, a participação de partidos políticos e governos. Mas, em sua sexta edição, o Fórum Social Mundial (FSM) acontece em um país cujo governo é apoiado por muitas das organizações presentes ao encontro.

Essa novidade gera uma relação nem sempre fácil, segundo o chileno Carlos Torres, do centro canadense de estudos Alternatives, única organização estrangeira representada no Comitê Organizador da Venezuela. "Estamos realizando este encontro num país que é governado por um presidente que, mesmo não tendo chegado ao poder com mobilizações ligadas ao Fórum, aplica muitas políticas defendidas por nós", avalia.

O assessor especial de Assuntos Internacionais do presidente Hugo Chávez, Maximiliam Arvelaiz, também cita os feitos de seu governo que agradam à maioria dos participantes do Fórum. "Reforma agrária, software livre, eliminação dos transgênicos, atendimento público de saúde nos bairros", lista Maximiliam, responsável pelo diálogo do Estado com os organizadores do FSM.

No entanto, Torres destaca que, mesmo tendo "baixado algumas políticas do Fórum para a realidade", a Venezuela não conta com movimentos sociais fortes. O fortalecimento dessa sociedade civil venezuelana pode ser um ensinamento do FSM ao país, na visão do economista chileno.

Já Maximiliam não considera que os movimentos sociais venezuelanos "sejam fracos ou fortes". "O povo está se organizando, mas em formas que estão enquadradas em outra lógica. Quem vem de fora pensa em organizações pressionando o governo. Aqui, o povo também está se organizando, mas em modos diferentes, nos comitês de uso da água nos bairros, nos comitês de saúde, nas rádios comunitárias", diz. Segundo ele, são formas de democratização do Estado e de participação popular independem de outras formas de organização, como sindicatos.

O sociólogo argentino Emilio Taddei considera que essas experiências governamentais são importantes para o Fórum. Mas "Esses processos beneficiam os movimentos, mas é óbvio que existe uma relação de tensão cooperativa entre governos e sociedade civil", avalia Taddei, que representa no Conselho Internacional do Fórum o Conselho de Ciências Sociais Latino-americanos (Clacso).

Também considera que a vitória eleitoral de candidatos de esquerda na maior parte dos países da América do Sul tem de estar na agenda do FSM. "Não vamos alterar a Carta de Princípios para que entrem os partidos políticos, mas é óbvio que essas vitórias eleitorais representam uma vitória contra o neoliberalismo e que temos de discutir isso", diz Taddei.

A opinião é compartilhada por outro integrante do Comitê Organizador na Venezuela, Jacobo Torres, da Força Bolivariana de Trabalhadores, uma corrente sindical venezuelana. "Os movimentos sociais são autônomos. Mas, se não se vinculam às situações reais, não têm como responder às necessidades dos povos", disse no debate O Futuro do Fórum, na quarta-feira (25).