Chegou a «revolução colorida» [1] que se esperava na Bósnia desde há um ano. Mas, o mais importante é que, ao contrário do que esperavam os analistas, a «mudança de regime» vai para além da componente sérvia: a República Srpska. Está a dar-se um putsch que se estende a todo o país –a Federação da Bósnia-Herzegovina– e que chegará finalmente à República Srpska.

Trata-se de um facto muito importante já que sugere que os serviços secretos ocidentais –e, supostamente, também os seus Estados– querem limpar o terreno político em todo o país. O plano consiste em explorar a crescente insatisfação social – mais que justificada– para provocar o caos total. Esse caos, assim como a ilusão de «uma vida melhor», que os média ocidentais e os centros de propaganda estimularam na imaginação das massas populares, serão utilizados posteriormente para pôr no poder uma nova equipe de títeres, não só a nível das autoridades regionais como também no poder central.

Milorad Dodik, presidente socialdemocrata da Republika Srpska desde 2010.

O objetivo principal continua a ser desfazerem-se do presidente Milorad Dodik e acabar com a política independente deste dirigente na Republika Srpska, para instalar em Banja Luka uma equipe que permita a inclusão da entidade autónoma sérvia no Estado bósnio centralizado. Os demais objetivos são a incorporação de toda a Bósnia- Herzegovina na OTAN, e a sua total adaptação às estruturas ocidentais euro-atlantistas.

À luz da Constituição em vigor, tudo isso é impossível sem o consentimento do governo da Republika Srpska. É por essa razão, que o primeiro passo tem que ser instaurar um governo que “coopere”. Muito depressa o actual protetorado –que goza de uma autonomia local muito limitada– se transformaria, então, numa colónia do Ocidente.

Tal como os manifestantes de Kiev, os da Bósnia agem movidos pela ilusão que a única coisa que faz falta é «deitar abaixo os maus» para
lograr «uma vida melhor», da qual têm uma visão nebulosa e absolutamente indefinida. Mas, essa «vida melhor» nunca se conseguirá, se a sua obtenção se coloca nas mãos dos títeres que o Ocidente quer instalar no poder.

Como já se viu na Ucrânia, só a Rússia tem a capacidade material necessária para ajudar a melhorar a qualidade de vida desse país. A União Europeia já deixou muito claro que carece de meios materiais para contribuir na reconstrução da Ucrânia, mesmo que tenha dinheiro suficiente para pagar as proezas de rua dos hooligans. E o que é válido para a Ucrânia, também o é para a Bósnia e para a Republika Srpska.

Os motins registados, desde há uns dias, na Federação da Bósnia-Herzegovina, inicialmente em Tuzla antes de se estenderem a Sarajevo e a outras cidades da região central da Federação, caracterizaram-se, desde a primeira hora, pela extrema violência dos manifestantes. Tendo em conta o facto que as operações de «mudança de regime» geralmente se baseiam no cenário de «resistência não violenta», traçado por Gene Sharp, pode parecer estranho que no caso da Bósnia se tenha suprimido a fase não violenta.

A primeira fase do esquema habitual –baseado numa provocação inicial, que desencadeia uma explosão de desordens– prevê, pelo contrário, provocar um ataque do governo contra manifestantes pacíficos, que serão apresentados pela imprensa como vítimas inocentes. No entanto, parece que os organizadores ocidentais estão impacientes por liquidar o assunto, o mais rápidamente possível, tanto na Ucrânia como na Bósnia-Herzegovina. Quiçá, seja por isso, que tenham decidido acelerar o processo de instalação dos seus títeres no poder, agora que ainda têm tempo para manter a ilusão de «uma vida melhor», apadrinhada pelo Ocidente, e antes que as más noticias sobre a crise que afecta os países ocidentais cheguem aos ouvidos das massas populares dos países do leste.

O modo como se maneja a revolta aparece, brevemente, refletida na seguinte imagem, divulgada num dos sítios web que apoiam o movimento anti-governamental.

Nesta sugestiva imagem destacam-se, no mínimo, 3 coisas:
 A primeira é o nível de agressividade de rua que praticam os manifestantes, e que inclui a queima de pneumáticos.
 A segunda é o conhecido símbolo da Otpor!, o punho ao alto, que tem caracterizado
todas as operações similares desde a realização da primeira revolução colorida, bem sucedida, organizada sob controlo ocidental em Belgrado, em outubro do ano de 2000, o que indica –como é suposto– de onde provêm a força motriz dos acontecimentos que estamos vendo.
 Finalmente, o texto em inglês, algo deslocado num movimento supostamente bósnio. Trata-se, evidentemente, de um lapsus que seguramente será corrigido com o tempo, já que indica claramente quem se acha por detrás de toda esta farsa.

Além dos elementos que acabamos de assinalar, também estão presentes os outros traços, característicos, das operações orquestradas dentro dos princípios traçados por Gene Sharp. A infraestrutura para a mudança de regime –que os especialistas ocidentais têm vindo a construir, pacientemente, na Bósnia, durante os últimos 2 anos, recebeu finalmente a ordem de activação. O que estamos vendo é o resultado da actividade de redes muito organizadas e ligadas entre si, que cobrem toda a Federação, incluindo a Republika Srpska, e que actuam em conjunto para alcançar objetivos idênticos, utilizando para isso todos os meios da tecnologia moderna postos à sua disposição. A demagogia, convenientemente nebulosa, menciona temas não claramente definidos, como o «respeito dos direitos humanos» e «um amanhã melhor», mas que, obviamente, garantem um amplo apoio popular na Bósnia –a erradicação dos efeitos da radioactividade teria o mesmo êxito em Fukushima. No entanto, ó surpresa!, nenhum dos sublevados propõe medidas políticas concretas para a realização de tão nobres ideais.

A ideia de convidar as forças policiais a juntarem-se aos manifestantes, também vem do método de Gene Sharp. Os organizadores anónimos dos motins de Tusla apresentam-se sob o acrónimo «Udar» [em português «golpe»], uma maneira muito clara de identificação com a organização política do ucraniano Vitali Klitschko [2].

É evidente que os governos das duas entidades, que formam a Bósnia-Herzegovina, não estão preparados para enfrentar o destino que se lhes depara. Na Federação, os políticos muçulmanos acreditaram, tontamente, que o apoio táctico do Ocidente era uma garantia a longo prazo, cometendo, assim, o mesmo erro que o presidente egípcio Hosni Mubarak, que também acreditou que a sua posição era segura, enquanto os Estados Unidos treinavam activistas, do movimento juvenil 6 de abril, com intenções de o derrubar.

E, na Republika Srpska, não é só a coligação que actualmente exerce o poder, que não teve tempo de avaliar a situação para tomar medidas eficazes. É possível que os líderes da oposição despertem um dia, dando-se conta que os seus mentores ocidentais os tenham enganado, com o único propósito de os utilizar contra o presidente Dodik, e que uma nova equipa de protegidos, discretamente formados pelo Ocidente, se instalará no poder deixando a oposição nacional fora de jogo.

Tradução
Alva

[1As «revoluções coloridas» não têm como objetivo a transformação da sociedade mas sim únicamente o de provocar mudanças de regime, aplicando para isso as teorias que Gene Sharp elaborou para a OTAN. Cf. «La Albert Einstein Institution: no violencia según la CIA» (castelhano-«O Instituto Albert Einstein: a não-violência segundo a CIA»-ndT), por Thierry Meyssan, Red Voltaire, 10 de febrero de 2007.

[2Vitali Klichko é um ex-boxeur ucraniano que chegou ao mundo da política em 2006 sob a etiqueta do partido Pora!, criado pelos homens de Gene Sharp como homólogo do movimento sérvio Otpor!. Em 2012, Klichko pôs-se à cabeça de uma coligação(coalizão-Br), a Aliança Democrática Ucraniana para a Reforma, cujo acrónimo em língua ucraniana, Udar, significa “ o golpe”, o que se apresenta como um jogo de palavras sobre a capacidade do boxeador e a tomada de poder. NdR.