O Presidente Putin expõe-se. Ele reuniu 80. 000 pessoas num estádio para celebrar a reunificação com a Crimeia e a luta contra os neo-nazis ucranianos. Enquanto isso, em Kiev, nenhuma multidão desceu às ruas para apoiar o Presidente Zelensky que se esconde.

Este artigo dá seguimento a :
 1. « A Rússia quer obrigar os EUA a respeitar a Carta das Nações Unidas », 5 de Janeiro de 2022.
 2. « Washington prossegue o plano da RAND no Cazaquistão, a seguir na Transnístria », 11 de Janeiro de 2022.
 3. « Washington recusa ouvir a Rússia e a China », 18 de Janeiro de 2022.
 4. « Washington e Londres, atingidos de surdez », 1 de Fevereiro de 2022.
 5. « Washington e Londres tentam preservar a sua dominação sobre a Europa », 8 de Fevereiro de 2022.
 6. “Duas interpretações do processo ucraniano”, 16 de Fevereiro de 2022.
 7. «Washington canta vitória, enquanto seus aliados se retiram », 22 de Fevereiro de 2022.
 8. «A Rússia declara guerra aos Straussianos», 3 de Março de 2022.
 9. «Um bando de drogados e de neo-nazis», 5 de Março de 2022.
 10. «Israel aturdido pelos neo-nazis ucranianos», 8 de Março de 2022.

As operações militares prosseguem na Ucrânia com duas narrativas radicalmente diferentes segundo o que se escuta nos média (mídia-br) ocidentais ou russos. Estas duas versões afastam-se não apenas na descrição da guerra, mas também e sobretudo ao descrever os objectivos desta guerra.

No Ocidente, o público está persuadido que o Exército russo tem enormes problemas logísticos e não consegue abastecer os seus carros blindados com carburante. Os seus aviões atingem indistintamente alvos militares e civis, destruindo cegamente cidades inteiras. O “ditador” Putin não parará enquanto não tiver esmagado Kiev e morto o Presidente eleito Zelensky. A seus olhos a Ucrânia é culpada por ter escolhido a democracia, em 2014, em vez de reconstituir uma “União Soviética”. Daqui até lá, semeia a morte e a desolação sobre uma população civil, enquanto os seus soldados se deixam matar em grande escala.

Pelo contrário, na Rússia, pensa-se que os combates estão limitados a zonas precisas, no Donbass, na costa do Mar de Azov e nos alvos militares um pouco por todo o lado. Claro, deplora-se alguma perdas, mas não uma hecatombe. Observa-se com estupefacção o apoio que os antigos aliados da Grande Guerra Patriótica (a Segunda Guerra mundial) dão aos Banderistas, os neo-nazis ucranianos. Espera-se que eles sejam todos neutralizados para que a paz possa regressar.

Como ruído de fundo, o Ocidente lançou uma guerra económica e financeira contra a Rússia. Muitas empresas ocidentais deixam o país e são imediatamente substituídas por outras vindas de países que não participam nesta guerra. A título de exemplo, os restaurantes McDonald serão substituídos pela cadeia turca Chitik Chicken, enquanto os Emirados Árabes Unidos acolhem os oligarcas expulsos da Europa. A China e a Comunidade Económica Eurasiática planeiam (planejam-br) a entrada em acção de um sistema económico e financeiro paralelo ao de Bretton Woods. Em resumo, o mundo parte-se em dois.

Quem diz a verdade ?

Os Serviços Secretos russos estão persuadidos que o Presidente Volodymyr Zelensky fugiu de Kiev e que realiza as sua intervenções por vídeo a partir de um estúdio. Escrutinam todas as suas mensagens para localizar onde ele se esconde.

A guerra propriamente dita

Segundo os observadores da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE), quer dizer do fórum intergovernamental criado pelos Acordos de Helsínquia (1973-75), a frente do Donbass estava estabilizada desde há vários meses, quando os bombardeamentos recomeçaram a partir de quarta-feira 16 de Fevereiro de 2022 para atingir o paroxismo Sexta-feira 18 (mais de 1. 400 explosões ouvidas). os governos locais de Donestk e de Lugansk retiraram mais de 100. 000 pessoas para os proteger desse dilúvio de fogo.

Na noite do dia 18, começava a reunião anual das elites da OTAN, a « Conferência de Segurança de Munique ». Um dos convidados mais notados foi o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy. No dia 19, ele tomou a palavra e declarou que o seu país ambicionava dotar-se com a arma nuclear para fazer face à Rússia. A 20, em Moscovo (Moscou-br), a Duma estava em ebulição e votou uma moção pedindo ao Presidente Putin para reconhecer as duas repúblicas do Donbass como independentes, o que ele fez às pressas na noite do dia 21. No Kremlin nem sequer apareceram bandeiras das duas novas nações.

No dia 24, a operação militar russa começou com um bombardeio maciço dos sistemas de defesa anti-aérea, depois das fábricas (usinas-br) de armamento e dos quartéis de banderistas (os neo-nazis ucranianos). A estratégia militar russa foi improvisada, tal como o reconhecimento diplomático das repúblicas do Donbass. As tropas utilizadas estavam já exaustas pelas manobras que acabavam de realizar na Bielorrússia.

A Casa Branca e a imprensa ocidental, pelo contrário, ignorando a guerra do Donbass e as declarações do Presidente Zelensky, afirmavam que tudo isto estava previsto desde há muito tempo e que as tropas russas haviam sido posicionadas com antecedência. Não aceitando o “ditador” Putin a escolha dos ucranianos pela democracia, forçava-os a reintegrar-se no seu império tal como Leonid Brezhnev havia feito aos Checoslovacos em 1968. Esta leitura dos acontecimentos semeou o pânico em todos os antigos membros do Pacto de Varsóvia (que esqueceram que Brejnev não era russo, mas ucraniano).

Desde então, aplicando a técnica pioneira de Jamie Shea, durante a guerra do Kosovo, a OTAN narra todos os dias uma nova história moralista sobre os crimes da Rússia. O que vai desde o bombardeio irresponsável de uma central nuclear ucraniana na fronteira russa, até à anedota comovente de uma criança que alcança sozinha a liberdade atravessando a Europa até Berlim. Tudo isto é ridículo e aterrador, mas amplamente divulgado sem reflexão, nem verificação, pelos média ocidentais.

Joel Lion, então embaixador em Kiev, avisava contra os banderistas. Actualmente desempenha funções num posto do Ministério dos Negócios Estrangeiros em Israel.

A guerra diplomática

Como as coisas vão mal para o Exército ucraniano e seus auxiliares banderistas (ou « neo-nazis » segundo a terminologia russa), o Presidente Zelensky solicitou à embaixada chinesa em Kiev que transmitisse um pedido de negociações ao Kremlin logo no segundo dia de conflito. Os Estados Unidos inicialmente opuseram-se a isso antes de deixar andar. Durante os contactos, a França e a Alemanha tomaram iniciativas antes de serem substituídas pela Turquia e por Israel. O que é muito normal. Com efeito, a França e a Alemanha falharam nas suas obrigações deixando Kiev massacrar entre 13.000 a 22.000 pessoas, em violação dos acordos de Minsk de que eram garantes. Enquanto a Turquia apoiou os Tártaros ucranianos sem, no entanto, tomar qualquer acção na Ucrânia, e Israel subitamente tomou consciência que o perigo banderista (ou seja, «neo-nazi»), que o seu embaixador em Kiev denunciara, era bem real.

Essas negociações desenrolam-se bem, apesar do assassínio pelos banderistas ucranianos de um delegado do seu próprio país, o banqueiro Denis Kireev, culpado a seus olhos de ter afirmado que os Ucranianos e os Russos eram irmãos eslavos. Apesar também da asneira do Ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Jean-Yves Le Drian, que achou uma esperteza lembrar, com insistência, que a França é uma potência nuclear, provocando a colocação da Rússia em alerta nuclear.

Estas negociações poderão terminar de uma maneira difícil de imaginar: a Ucrânia, que incluiu 102. 000 banderistas nas suas forças de Defesa Territorial, poderá ser desarmada e colocada sob a protecção dos Estados Unidos e do Reino Unido (ou seja, na prática, da OTAN). É com efeito a única forma de respeitar os tratados, nomeadamente as Declarações de Istambul (1999) e de Astana (2010). A Ucrânia tem o direito de escolher os seus aliados, mas não de receber armas estrangeiras. Pode, pois, assinar acordos de Defesa, mas não ser colocada num comando integrado. O que é uma posição muito gaullista: Charles De Gaulle mantivera a assinatura da França no Tratado do Atlântico Norte, mas retirou o Exército francês do comando integrado da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e expulsara os soldados norte-americanos do solo francês.

A Rússia deverá ocupar permanentemente, ou mesmo anexar, a costa do Mar de Azov (incluindo Mariupol) para unir a Crimeia ao Donbass. Além disso, deve ocupar, ou mesmo anexar, o Canal da Crimeia do Norte, que aprovisiona em água potável a península da Crimeia. Por fim, ela poderá ocupar, ou mesmo anexar, a costa do Mar Negro (incluindo Odessa) de maneira a unir a Crimeia à Transnístria. A minoria húngara, também ela vítima dos banderistas que fecharam as suas escolas, poderá ser unida à Hungria. No entanto, o melhor é inimigo do bem : a perda de acesso pela Ucrânia ao mar poderá ser uma causa de conflitos futuros.

A única coisa certa, é que a Rússia continuará a sua acção até à neutralização de todos os banderistas e que Israel a apoiará nisso, mas não além disso. Deste ponto de vista, o encontro que o Presidente Putin convocou para Moscovo « contra os nazis » não é uma simples mensagem para a sua opinião pública de determinação, é já um grito de vitória. Todos os monumentos à glória de Stepan Bandera e dos nazis deverão ser destruídos. As outras nações que apoiaram os neo-nazis, nomeadamente a Letónia, deverão tomar isso como garantido.

Serguey Glazyev volta em grande. Após ter jogado um papel na privatização dos bens colectivos soviéticos, ele poderá construir um novo sistema financeiro global.

A guerra económica e financeira

É aqui onde tudo se joga para os Estados Unidos. Eles conseguiram, em alguns dias, que todos os seus aliados adoptassem medidas unilaterais (e portanto ilegais no Direito Internacional). Mas estas medidas, qualificadas de « sanções », embora sem julgamento, não são sustentáveis a médio prazo. Desde já provocaram uma especulação desenfreada sobre a energia e uma subida imediata dos preços na Europa. As grandes empresas europeias deixam a Rússia com a morte na alma. Elas garantem ao Kremlin que não têm escolha e que esperam voltar o mais rápido possível.

O Presidente Vladimir Putin põe em destaque os liberais que se acusava até há pouco de serem vendidos ao estrangeiro. O antigo Presidente Dmitry Medvedev está em graça de novo. A Directora do Banco Central russo, Elvira Nabiullina, que havia sido escolhida no momento do idílio com o Ocidente, foi apresentada à Duma para suceder a si mesma, mas agora para trabalhar com outros parceiros. Serguey Glazyev, cujo nome está associado às privatizações da era Ielstin, viu ser-lhe confiada a criação de um novo sistema económico e financeiro que se possa substituir ao concebido pelos Anglo-Saxões em 1944, Bretton Woods. Tudo lhes é perdoado, desde que garantam aos Chineses e à Comunidade Económica Eurasiática (Bielorrússia, Cazaquistão, Quirguistão, Rússia, Tajiquistão) que não serão estatistas.

O Papa Francisco aceitou acordar os velhos demónios das cruzadas. Em 25 de Março, ele consagrará a Ucrânia e a Rússia ao Coração imaculado de Maria, segundo os votos desta transmitidos pelos videntes de Fátima durante a Revolução russa.

A guerra ideológica

A paz na Ucrânia não irá resolver o conflito russo-americano que está em aberto desde 17 de Dezembro de 2021. Isso irá continuar por outros confrontos. Por seu lado, os Straussianos, que usaram e abusaram de argumentos religiosos para atacar a Rússia na Bósnia-Herzegovina, no Afeganistão, na Chechénia e no Médio-Oriente Alargado, têm claramente intenção de os utilizar a nível global.

Recordemos que o orientalista straussiano Bernard Lewis (antigo agente dos Serviços Secretos britânicos, depois membro do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, depois conselheiro de Benjamin Netanyahu) tinha concebido um meio para mobilizar os árabes, em lugar dos Ocidentais, contra os Russos. Era a estratégia do « choque de civilizações ». Ele explicara que no Afeganistão os crentes muçulmanos deviam bater-se contra os Soviéticos ateus. Foi esta a visão que foi concretizada pelos árabes-afegãos de Osama bin Laden. A mesma estratégia foi utilizada com êxito na Bósnia-Herzegovina e na Chechénia. No primeiro teatro de operações, a OTAN apoiou-se no Exército saudita e nos Guardas da Revolução Iranianos (assim como alguns elementos do Hezbolla libanês). Um Straussiano, Richard Perle, tornou-se mesmo conselheiro diplomático do Presidente bósnio, Alija Izetbegović, de quem Osama Bin Laden era o conselheiro militar. Mais tarde, durante a Segunda Guerra da Chechénia, os Straussianos montaram a aliança entre os Banderistas ucranianos e os islamistas chechenos (Congresso de Ternopol, 2007), com o apoio logístico da Milli Görüş (então dirigida por Recep Tayyip Erdoğan). Todos se bateram lado a lado pelo Emirado islâmico da Itchkéria (Chechénia). Em última análise, a estratégia de Bernard Lewis foi popularizada pelo seu assistente, Samuel Huntington. No entanto, ele não a apresentou como um plano militar, mas como uma fatalidade assim explicando oportunisticamente a atribuição dos ataques do 11 de Setembro de 2001 aos muçulmanos em geral.

Considerando que nada detêm as gentes que se batem crendo servir a Deus, os Straussianos decidiram desde há quatro anos reactivar o cisma que separou os Católicos dos Ortodoxos no século XI. Primeiro, dedicaram-se a cindir a Igreja ortodoxa ucraniana do Patriarcado de Moscovo. Conseguiram-no com a ajuda da Turquia que fez pressão sobre o Patriarca de Constantinopla. Trata-se agora de desencadear novas paixões ressuscitando as profecias de Fátima. Em 1917, logo após a Revolução Russa, videntes portugueses relataram aparições da Virgem Maria. Ela confiou-lhes várias mensagens, entre as quais uma denunciando o derrube do Czar de direito divino. A Rússia foi apresentada como tendo escolhido o mal e tentando espalhá-lo. Por consequência, o Conselheiro de Segurança Nacional, Jake (“the snake”) Sullivan, foi a Roma, por ocasião de uma reunião com a China, para de facto convencer o Papa Francisco. E conseguiu.

Foi afinado um calendário. O Presidente Zelenski dirigiu-se ao parlamento francês, depois o Presidente Biden virá à Europa presidir a uma cimeira (cúpula-br) extraordinária da OTAN e finalmente o Papa Francisco, realizando a prece da Virgem Maria em Fátima, consagrará a Ucrânia e a Rússia ao imaculado Coração da Virgem. Esta montagem pode parecer artificial, mas o seu efeito deverá ser poderoso. Para muitos católicos, combater a Rússia tornar-se-á então um dever religioso.

Conclusão

Nas próximas semanas, o Presidente Joe Biden deverá agarrar-se a um novo discurso. Tratar-se-á de apresentar a paz na Ucrânia como uma vitória da sabedoria. Pouco importa que os Ucranianos tenham jogado e perdido. Pouco importa que os banderistas estejam prisioneiros ou mortos. Pouco importa que a Ucrânia perca o seu acesso ao mar. Os Aliados serão convidados a aumentar as suas despesas militares e a pagar com os seus fundos toda esta carnificina.

PS. A minha crónica da semana passada foi ilustrada por erro com uma fotografia de Reinhard Gehlen em vez de uma de Stepan Bandera. Pedimos que nos desculpem.

Tradução
Alva

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