O que a oposição brasileira têm em comum com a venezuelana?

Emir Sader

Em primeiro lugar, o peso que os grandes monopólios privados da mídia tem dentro da oposição. Lá como cá, quem dá as pautas de ação da oposição, quem se encarrega de massificá-las, de reiterá-las centenas e milhares de vezes, é a mídia, que funciona como uma espécie de partido da direita.

Para nós não é novidade. Toda a campanha prévia ao golpe militar de 1964 foi protagonizada pelos jornais privados – que, vale sempre a pena recordar, concitavam ativamente o golpe, à exceção da Última Hora -, com os partidos atuando como agentes da ação jornalística. Tem sido assim, cada vez mais, especialmente nas campanhas eleitorais, mas nos grandes acontecimentos – campanha pelas eleições diretas, pelo impeachment de Collor, denúncias atuais contra o PT -, esse papel é preponderante, até mesmo em definir a importância, determinando as pautas em debate no país e os enfoques que são dados a elas.

No golpe dado contra o governo de Hugo Chavez, em abril de 2002, essa função da grande imprensa privada venezuelana foi escandaloso. O expressivo documentário “A revolução não será televisionada”, feito por um canal escandinavo, relata esse papel, foi um grande sucesso nos canais alternativos, mas significativamente a grande mídia – escrita e televisiva – calou-se sobre o documentário. Porque este se constituiu em uma denúncia viva sobre o papel político dessa mídia.

Apenas para recordar, além de ter incitado o golpe sistematicamente na sua programação, ter convocado manifestações contra o governo – bem ao estilo do golpe de 1964 no Brasil -, ter apoiado o efêmero presidente da Federação das Industrias que assumiu o governo – fechando o Parlamento e o Judiciário, anunciando a privatização da empresa de petróleo, afoitamente - no momento em que a participação popular recolocou Hugo Chavez no poder, todos os canais privados de televisão deixaram de dar qualquer noticia, passando a exibir desenhos animados.

Em outras circunstâncias, essa mídia monopolista privada convocou uma lockout empresarial, que incluiu a empresa estatal do petróleo e durou vários meses. A programação televisiva exibe personagens da direita incitando ao assassinato do presidente da República e a outras formas de ações terroristas contra instalações estatais.
Em comum com a mídia privada brasileira está o caráter monopolista das duas, centradas em algumas poucas famílias e nos seus vínculos estreitos com as associações empresariais. Além disso, outro parentesco está na presença de grandes magnatas privados da mídia, vinculados a essas famílias, que ao mesmo tempo estão na lista das maiores fortunas do país e até mesmo do continente.

Se fosse necessário encontrar outro vínculo entre as duas oposições midiáticas, estão os reiterados rumores de que Gustavo Cisneros, o maior magnata da imprensa privada venezuelana e um dos maiores milionários do continente, teria comprado ações da endividadíssima Editora Abril brasileira.

Não seria necessário este vínculo econômico direto para explicar os estilos de uma revista como a Veja e as similares da Venezuela, mas esse vínculo consolidaria os laços dessa cadeia de mídia bushiana no continente.
Além disso, a oposição de lá e de cá, buscam a ingovernabilidade, tratando de criar situações de desestabilização dos governos. Sua ação faz parte do projeto político do governo Bush, de enfraquecer a aliança regional que integra o a Argentina, o Uruguai, a Venezuela, Cuba, entre outros e que tem no Brasil seu eixo.

É uma oposição conservadora, que ressucita métodos da “guerra fria”, seja com a diabolização dos adversários, seja com a repetição sistemática dos mesmos chavões, com denuncias reiteradas, com algum fundamento ou não. A matéria sobre a nunca comprovada ajuda financeira de Cuba ao governo Lula é um tem constante e similar, aqui, na Venezuela, no México, na Bolívia e na Colômbia.

A oposição venezuelana apelou diretamente para o golpe e, derrotada, tenta agora conclamar a uma ação militar externa, com a tentativa de deslegitimar o sistema político.

A oposição brasileira têm brandido o impeachment, a grande mídia privada tratou de criar as condições para isso, sem consegui-lo, mas um dos partidos opositores – o PFL, laranja do PSDB – diz que vai apresentar a proposta que, mesmo sem chance de vingar, trataria de manter a idéia da falta de legitimidade de Lula, durante toda a campanha eleitoral.

A própria reação “indignada” da grande mídia privada monopolista, dos partidos opositores e das associações empresarias brasileiras às declarações de Lula servem como confirmação da certeza da comparação. Senão não teriam vestido a carapuça.