Paul Wolfowitz

A rede internacional de movimentos sociais e organizações não-governamentais Jubileu Sul divulgou nota oficial criticando duramente a indicação de Paul Wolfowitz para a presidência do Banco Mundial. Intitulada “De Wolfensohn a Wolfowitz, o lobo imperial mostra seus dentes”, a nota afirma que a indicação feita pelo presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, só reforça o fato de que o Banco Mundial continua sendo um instrumento da estrutura global de poder liderada pelo governo norte-americano.

Mas o que é escandaloso não é propriamente a indicação de Wolfowitz, acrescenta a organização, e sim as políticas do Banco Mundial, baseadas no Consenso de Washington, apoiadas pelos integrantes do G-8 (grupo que reúne as oito nações mais ricas do planeta), inclusive aqueles que agora criticam a indicação de Wolfowitz (uma referência aos países europeus, membros do G-8, que resistem ao nome do norte-americano).

A indicação de Wolfowitz, reconhece o Jubileu Sul, é, sem dúvida, motivo de reprovação por se tratar de “um homem do Pentágono manchado de sangue e petróleo e dar continuidade à tradição que atribui aos EUA o direito de nomear o presidente do Banco Mundial”. Não é a primeira vez que isso acontece, lembra ainda a nota.

Entre 1968 e 1981, o Banco Mundial foi dirigido por outro empresário-guerreiro, o ex-secretário de Defesa dos EUA Robert McNamara, que coordenou a política externa norte-americana durante a Guerra do Vietnã. “Mas o que é central”, argumenta o texto, “é a política que esta instituição leva adiante independentemente dos personagens, uma instituição sempre fiel a uma estrutura de poder que mata cerca de 250 mil pessoas por dia, vítimas das políticas de ajuste estrutural e dos interesses imperiais que se opõem tenazmente à redistribuição do poder econômico e social no mundo”.

A mensagem de Washington

Na avaliação dos dirigentes do Jubileu Sul, a indicação de Wolfowitz traz consigo um claro recado de Washington ao mundo. O recado, que coincide com o segundo aniversário da invasão e ocupação do Iraque, seria o seguinte: o Banco Mundial, e o próprio conceito de desenvolvimento, devem seguir ocupando um lugar central na guerra neoliberal impulsionada pelos EUA contra o direito dos povos à autodeterminação e à escolha de qual modelo de desenvolvimento querem implantar em seus países.

O Jubileu Sul sustenta que a dívida externa dos países do hemisfério Sul é ilegítima e consiste em uma construção ideológica que oprime os povos desta região do planeta. Essa construção, implementada por organismos internacionais como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI), é defendida pela maioria dos governos e das elites no poder tanto no Norte quanto no Sul. A indicação de Wolfowitz não seria contraditória com essa política.

O fato de alguns países e organizações mostrarem reserva e resistência ao nome de Wolfowitz é um claro indicativo, analisa a organização, do reconhecimento dos riscos trazidos pela rebelião internacional em curso contra a ortodoxia das políticas do FMI e do Banco Mundial e contra seu atrelamento aos interesses imperiais dos EUA. A indicação de um dos principais articuladores das políticas do Pentágono para a presidência do Banco Mundial deixa exposto como nunca a íntima relação entre o imperialismo econômico e o imperialismo militar, conclui a nota.

A partir deste quadro, o Jubileu Sul faz uma convocação internacional não só para reverter a indicação de Wolfowitz, mas também para desautorizar as políticas do Banco Mundial e para desencadear uma campanha global em favor do fechamento da instituição, que se converteu mais do que nunca em um braço direto das políticas do governo Bush.

Quem é Paul Wolfowitz

No dia 16 de março, o presidente dos EUA, George W. Bush, propôs oficialmente a nomeação de Paul Wolfowitz para a presidência do Banco Mundial. Ao anunciar a indicação, Bush afirmou: “Paul é um bom homem, tem coração”.

Tradicionalmente, os EUA indicam o presidente do Banco Mundial e os europeus o do FMI. Essa tradição está baseada em um acordo informal em vigor desde a criação das instituições financeiras multilaterais, depois da Segunda Guerra Mundial. Paul Wolfowitz, de 61 anos, é um dos principais ideólogos conservadores que sustentam o governo Bush.

Um dos autores da doutrina da guerra preventiva, Wolfowitz foi um dos articuladores da invasão do Iraque e da tentativa do governo Bush de “levar à democracia para o Oriente Médio”. Ele foi embaixador dos EUA na Indonésia de 1986 a 1989, durante o governo Reagan, e trabalhou outros três anos como responsável pelas relações dos EUA com 20 países do sudeste da Ásia.

Atualmente, Wolfowitz trabalha como secretário assistente da Defesa. Sua indicação causou reações contrárias em vários países e organizações, inclusive no interior do próprio Banco Mundial. A diretoria do banco decidiu chamá-lo para uma entrevista, um convite inédito na história recente da instituição, que expressa bem a surpresa causada por sua indicação. Em um comunicado oficial, o banco informou que seus diretores executivos concordaram em realizar “conversas informais” com Wolfowitz, classificando-as como “parte do processo de consulta”.

O comissário do Desenvolvimento e Ajuda Humanitária da União Européia, Louis Michel, também convidou o norte-americano para uma conversa sobre a luta contra a pobreza e o papel do Banco Mundial. Uma das críticas mais duras à indicação partiu da revista inglesa The Economist. Para presidir o Banco Mundial, ele terá que provar que não é um lacaio de quem o indicou, resumiu a publicação.

“A raposa tomando conta do galinheiro”

A revista também criticou o que chamou de “descaramento” do presidente George W. Bush em suas últimas nomeações, como a do unilateralista John Bolton como embaixador na Organização das Nações Unidas (ONU) e, agora, a do segundo homem do Pentágono para dirigir o Banco Mundial. “O que mais preocupa”, disse ainda a revista, “é a condição de idealista - alguns diriam utopista - de Wolfowitz, cuja carreira foi marcada pelo zelo de levar a democracia ao mundo, independentemente do que o mundo pudesse pensar sobre esta ambição”.

A indicação também foi bombardeada pelo jornal Financial Times, que, em um editorial afirmou: “Colocar o arquiteto unilateralista da guerra do Iraque à frente da mais importante agência multilateral de desenvolvimento é como colocar a raposa cuidando do galinheiro”. Para o FT, o mundo verá Wolfowitz como mais um cônsul do império dos Estados Unidos