Iniciamos a publicação por episódios do livro de Thierry Meyssan, «Sob os nossos Olhos». Trata-se de contar por escrito de forma ambiciosa a História dos dezoito últimos anos a partir da experiência do autor ao serviço de vários povos. Este livro não tem equivalente, e não pode ter, na medida em que nenhum outro homem participou nestes acontecimentos sucessivos na América Latina, em África e no Médio-Oriente ao lado dos governos postos em causa pelos Ocidentais.
«Todos os Estados se devem abster de organizar, de ajudar, de fomentar, de financiar, de encorajar ou de tolerar actividades armadas subversivas ou terroristas destinadas a mudar pela violência o regime de um outro Estado, assim como de intervir nas lutas intestinas de um outro Estado» _ Resolução 2625, adoptada a 24 de Outubro de 1970 pela Assembleia Geral das Nações Unidas
Preâmbulo
Nenhum conhecimento é definitivo. A História, como qualquer outra ciência, é uma constante interrogação sobre o que se acreditava ser certo e o que, considerando novos elementos, se modifica, ou seja, é até mesmo desmentido.
Eu rejeito a escolha que nos é proposta entre o «limite da razão» e o «pensamento único» por um lado, e as emoções e a «post-verdade» por outro. Situo-me num outro plano : eu busco distinguir os factos das aparências, a verdade da propaganda. Acima de tudo, enquanto alguns homens tentarem explorar outros não creio que as relações internacionais possam ser totalmente democráticas e portanto transparentes. Por conseguinte, para lá da astúcia, por natureza é impossível interpretar com certeza os acontecimentos internacionais quando eles se dão. A verdade apenas pode vir à luz do dia com o tempo. Eu aceito a ideia de me poder enganar no imediato, mas jamais renuncio a questionar as minhas impressões e a refazê-las. Este exercício é tanto mais difícil quando o mundo experimenta guerras que nos obrigam a tomar posição sem demoras.
Pela minha parte, eu alinho no partido dos inocentes, os quais veem desconhecidos penetrar nas suas cidades e aí impor a sua lei, inocentes que ouvem as televisões internacionais repetir o mantra segundo o qual os seus dirigentes são tiranos e que devem ceder a posição aos Ocidentais, inocentes que se revoltam e são então esmagados pelas bombas da OTAN. Eu reivindico ser, ao mesmo tempo, um analista tentando analisar com objectividade e um homem que trás socorro, dentro dos seus meios, àqueles que sofrem.
Ao escrever este livro, pretendo ir ao fundo da documentação e dos testemunhos directos actuais. No entanto, ao contrário dos autores que me precederam, eu não procuro demonstrar a boa fé da política do meu país, mas antes compreender o encadear dos acontecimentos, a propósito dos quais acontece ter eu sido tanto um espectador como um interventor.
Alguns objectarão que, contrariamente a minha profissão de fé, eu busco, na realidade, justificar a minha acção e que, consciente ou inconscientemente, dou mostras de parcialidade. Espero que eles venham a participar no estabelecimento da verdade e me indiquem ou publiquem os documentos que eu ignoro.
Acontece, de facto, que o meu papel nestes acontecimentos me permitiu apreender, e verificar, numerosíssimos elementos desconhecidos do grande público, e bastantes vezes de muitos outros actores. Adquiri este conhecimento de maneira empírica. Só progressivamente é que eu compreendi a lógica dos acontecimentos.
Para permitir ao leitor seguir o meu percurso intelectual, eu não escrevi uma História Geral da Primavera Árabe, mas, sim três histórias parciais dos últimos dezoito anos, a partir de três pontos de vista diferentes : o dos Irmãos Muçulmanos, o dos sucessivos governos Franceses, e o das autoridades Norte-americanas. Para esta edição, inverti a ordem destas partes em relação às edições precedentes onde havia colocado a acção da França em primeiro lugar. Com efeito, trata-se aqui de abranger um público internacional.
Em busca do Poder, os Irmãos Muçulmanos colocaram-se ao serviço do Reino Unido e dos Estados Unidos, enquanto ponderavam sobre como atrair a França para a sua luta de domínio sobre os Povos. Perseguindo os seus próprios objectivos, os dirigentes franceses não procuraram compreender a lógica dos Irmãos Muçulmanos, nem a do seu suserano norte-americano, mas unicamente acertar nas vantagens da colonização e encher os bolsos. Apenas Washington e Londres tinham toda a informação sobre o que se passava e aquilo que preparavam.
O resultado assemelha-se pois ao das matrioskas russas: só com o desenrolar do tempo se percebe a organização dos acontecimentos que pareciam, à primeira vista, espontâneos, tais como as premissas e as conclusões de determinadas decisões.
O meu testemunho é de tal modo diferente do que os leitores terão lido ou ouvido sobre o mesmo assunto que alguns ficarão assustados com o que escrevo. Outros, pelo contrário, irão interrogar-se sobre esta gigantesca manipulação e do modo como lhe pôr um fim.
É provável que este livro, que expõe centenas de factos, inclua alguns erros que eu irei corrigindo no futuro. É possível que uma ou outra das correlações que eu saliento sejam apenas fruto do acaso, mas, seguramente, não a sua totalidade.
Inúmeras pequenas rectificações foram sendo incluídas em função de sucessivas revelações ulteriores sobre este período.
Que não restem dúvidas, os partidários do imperialismo não deixarão de me acusar de «conspiracionismo», de acordo com a sua expressão fetiche. É uma acusação gratuita que usam desde há 15 anos. Têm abusado dela desde que eu comecei a contestar a versão oficial dos atentados do 11-de-Setembro de 2001. Eles persistem na sua negação (ou mentira ?) e, claro, desmascaram-se quando apoiam publicamente a Alcaida na Líbia e na Síria ao mesmo tempo que a acusam de massacre nos Estados Unidos, na França, na Bélgica, etc.
O consenso de jornalistas e de políticos não tem mais valor do que o dos teólogos e dos astrónomos face às descobertas de Galileu. Jamais qualquer consenso permitiu estabelecer a verdade. Apenas a Razão aplicada às provas nos permite a sua aproximação.
Em última análise, uma vez os erros menores corrigidos, é a este somatório de factos que cada qual, sendo honesto, deverá responder propondo para tal uma explicação lógica e coerente.
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